A. Jorge Ribeiro
Um homem, quando adrega de apaixonar-se, ou mar ou terra.
Textos
Rediviva 5 – Fernando Augusto de Lacerda e Mello
Relembrando: regressei à crusta neste corrente ano, em casa da família do meu primo Amadeu Gonçalo, na rua de Lavatães da freguesia de Lamelas, concelho de Santo Tirso. Reincarnei como vivia, nos princípios do ano distante que veria o armistício finalizador da primeira guerra mundial, assinado entre os alemães e os aliados.
Este mês de agosto está autêntico.
Mas há quem tenha vivido na aldeia, sem estradas, nem gente, nem verão. Cito-lhe as palavras escritas: “O céu e a terra estão feios, feios até ao enojo – queira perdoar-me o sublime criador e conservador da terra e do céu. São hoje seis dias corridos do mês de julho de 1866. E eu tenho frio. A chuva estaleja nas vidraças e o vento assobia nos vigamentos. Os cabeços dos montes escondem-se nas névoas que vêm descendo, como em janeiro, e se desfazem em aguaceiros glaciais. Agora deponho a pena para espirrar. Anuncia-se-me a décima quarta bronquite desta quadra de zéfiros, rouxinóis e flores. Moscas há mais do que as da praga.” Idiossincrasias!
Fernando Lacerda nasceu em Loures, em 6 de agosto de 1865, e faleceu no Rio de Janeiro em 6 de agosto de 1918.
Como é que eu, desvanecida pelas maravilhas deste século a que tão recentemente aportei, hei de descrever e fazer crer as idiossincrasias de quem mergulhou de corpo inteiro no universo de Eça de Queirós?
Jornalista, cultor da calamidade imprevista por Gutenberg, Lacerda começou muito novo a sentir a mão a desviar-se da própria caligrafia e os dedos a fugirem velozes dos pensamentos ditadores de sabença própria.
Já observaram os radiestesistas, ainda que absolutamente analfabetos e ingénuos, a prospetar água no solo?
As varas da forquilha desobedecem à força musculosa dos pulsos, reviram-se e apontam o chão, mal o sensível se aproxima do veio aquoso. Do mesmo modo, o médium Lacerda confessou deixar-se levar pelo impulso das falanges, ao psicografar obras póstumas de insignes escritores portugueses.
Passámos de plagiadores do que se fazia lá fora a membros de uma grande comunidade que nos alimenta e socorre as finanças, sem perguntar como, porquê e para quê. Dão-nos uma falsa ideia de membros de países ricos. Como é que o Bordalo, se como eu reencarnasse neste século XXI, representaria o Zé Povinho? Não deixaria de caricaturar também a Zeza Povinha, com um friso de dentes implantados, um desses telefones/placa que todos trazem, um bioco de padrão Burberrys falso, e a mesma cara atávica de basbaque sorridente.
Em Até ao fim, Vergílio Ferreira, 1987, o biografado frequenta um Café Jesuíta em Coimbra. Segundo o escritor de Gouveia e Melo, no café há pouca gente às mesas de mármore e, descendo os degraus para a sala do bilhar, as conversas nas mesas são em silêncio e as carambolas na sala de bilhar não se ouvem.
Outro escritor contradiz-se: “Já começou a dormir há três anos o sono infinito,” mas “Os homens úteis não morrem inteiramente”.
“Há muita poesia na murta, e muita murta nos jardins e quintalejos de Portugal.”  

Amarílis
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ANTONIO JORGE
Enviado por ANTONIO JORGE em 12/10/2024
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