A. Jorge Ribeiro
Honra e proveito não cabem num saco
Meu Diário
07/02/2010 14h36
Coronel Baptista Coelho
Coloquei neste site e em e-livro uma biografia deste invulgar militar e homem de Estado tirsense, numa perspectiva relativamente singular: comparando-o a outro vulto também, de certa maneira, ligado a Santo Tirso, que foi D. António Barroso.

Por agora apenas registo a minha resposta a uma interpelação colocada por um leitor do «Jornal de Santo Thyrso» que me julgou, injustamente, no grupo desses detractores da pátria e de Portugal ou, melhor, da Pátria Portuguesa.


Eu sempre imaginei, receoso embora de me deixar embevecer pela glória de ser lido, os meus respeitáveis críticos, de vibrante dedo em riste, clamando: – Tu não me desmintas, seu palerma! – como António Silva no «Pátio das Cantigas».

Li, numa acta camarária tirsense de 15 de Abril de 1889, que a antiga rua Faria Guimarães entroncava com a rua Nova (rua de Vilalva, um dos limites da Quinta da Lante), e fui logo corrigido por um eminente contemporâneo (da rua) que a repeliu, a piparote, para o sentido oposto. Calei-me, apesar de comigo estar ainda Carlos Santarém (Apontamentos de História Local, cap. XXXIV), aceitando que as ruas das pequenas vilas são seres vivos que rastejam de quando em vez, como lhes compete.


Por eu considerar, em crónica avense, “mancomunados” Camilo e Silva Mendes na crítica aos tirsenses, apontaram-me o indicador de polegar engatilhado, avaliando que o adjectivo só poderia ser entendido em sentido literal, e ninguém presenciara o génio de Ceide, aos 78 anos, de mão dada com o jovem Manuel, então com 18, à porta do café do Gato. Não argui, pois quem não compreende aquela asserção também não compreenderá que se continue a aliar serrote e tirsenses, maugrado há muito não serem surpreendidos ao soalheiro catando, simultaneamente, os próprios piolhos e as vidas alheias.


Não esgrimi sobre os limites das Quintas da Trofa e do Montinho, sobre o padre Palmeiró, a “telha” do senhor Moreda, o «Flores do Ave», e outros reparos mais.


Este propósito – de não argumentar sobre assuntos tirsenses com quem os conhece muito mais profundamente que este restaurador de fotografias que outros tiraram, humilde mas invulnerável às esporas – tem-me animado.


O ridículo, visto isso, é como o inferno. Quem lá caiu, ficou. E eu já me sinto a liquidar contas nas fogueiras eternas, sem a atenuante duns escapulários a que os novos missionários chamam “notas de rodapé”. 


Mesmo assim, cá vai, com a advertência de que a nota de rodapé, aqui içada a corpo de texto, nada tem a ver com aquele friso de madeira que remata os soalhos e que, na minha terra, se chama “soco”. Deus me livre!

 
A cronologia dos factos históricos atirou-me ao rosto com uma fatalidade: que culpa terei eu que há cem anos, isto é, em 1910, estivéssemos entre a inquisição, aparentemente extinta em 1821, e a primeira guerra mundial, travada entre 1914 e 1918? 
Pequei porque, deixando-me levar pelo braço amável e terno de José Cardoso Santarém, respiguei uma local de 17-2-1910, em que ele chamou capitão e Coelho ao Coronel Baptista Coelho. Habituei-me a venerar o grande director do nosso jornal, orgulhoso por lhe ter sucedido.
 
Eu, que não quero outra coisa na vida que não seja nome em praça, nunca fiz questão que me chamassem António, ou Jorge, ou Pereira, ou Ribeiro… Se a alguém interessa a minha preferência inclino-me para o tratamento de «Antônio» que me dão as leitoras e poetisas brasileiras, idealizando eu um sensual trejeito de beiços escarlates impelido por aquele chapéu circunflexo que tanta falta faz de anteparo ao candente sol das terras de Vera Cruz como à ortografia!

Colhi o termo “carnificina” em Camilo, “carnificina de além-mar”, in «Cousas Leves e Pesadas», pág. 57 da 3ª edição. Ao revocar Camilo, não encontrei melhor termo; só no desastre angolano de Vau Pembe, ocorrido em 1904, pereceram 250 militares! Posso, com mais propriedade “bellum e bello” e menos vernaculidade, citar Alexandre Alberto da Rocha de Serpa Pinto que registou, em «Como Atravessei África», pág. 16 da edição de Londres de 1881, “Os Luinas, depois dessa carnificina traiçoeira, aclamaram seu chefe Chipópa, homem de tino”.


Escreveu Eça de Queirós que Portugal, entre 1840 e o fim de século, recuperou dos 25 anos que andava atrasado de França. “(Hoje, anda apenas quinze dias, quando não adianta.)”, afirmou nas «Cartas de Paris», pág. 285.


Santo Tirso, há cem anos e na vanguarda com a Europa, digeria muito bem metáforas, pleonasmos e metonímias. Agora, eructa e revessa se tiver de ingerir uma ironia ao natural ou uma catacrese vegetariana.

Publicado por ANTONIO JORGE
em 07/02/2010 às 14h36
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